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Doce como cana-de-açúcar

Me dá cana! Esse era o grito que ecoava das gargantas afinadas de quatro irmãos pequenos todas as vezes que os caminhões que transportavam cana-de-açúcar para Agroindústria Mangueira passavam na PI 115, que liga o município de Castelo do Piauí a São Miguel do Tapuio.


Isso acontecia nas primeiras décadas dos anos 80, quando morávamos na Fazenda Faveira, uma enorme propriedade destinada a criação de gado e animais de pequeno porte, onde meu pai trabalhava como vaqueiro.


O interesse era tanto que rapidamente aprendemos a diferenciar o zumbido dos caminhões e aos primeiros sinais corríamos em direção a estrada para vê-los apontando no horizonte, numa reluzência esverdeada provocada pelas cana-de-açúcar destinadas, cujo destino era a produção de cachaça.


Pés descalços na terra quente, olhos lacrimejando por conta da poeira e dos cristais de areia branca, barrigas rajadas de sujo e suor, nada nos parava, importante mesmo era entoar o grito pra chamar a atenção dos trabalhadores que viajavam empilhados em cima da carga de cana.


Doce como cana-de-açúcar eram os gestos daqueles homens pobres e sofridos, que mesmo depois de tanta labuta e trabalho duro se preocupam e separar as toras de cana para jogá-las para nós nas margens da estrada.


Doce como cana-de-açúcar são as deliciosas lembranças de um tempo de inocência em que uma das maiores preocupações era escutar o zumbido dos caminhões para ganhar cana-de-açúcar e saboreá-las nos dias quentes e tórridos do semiárido piauiense.


Doce como cana-de-açúcar foi a infância que tivemos, mesmo diante de tantas adversidades fazíamos da busca pela sobrevivência uma brincadeira constante e repleta de alegria e aprendizados.

Raimunda Alves Melo

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